ERA
SIMPLESMENTE UM DAQUELES DIAS, SEM DÚVIDA;- FRIO, TEMPESTUOSO, COM TERMÔMETRO
CAINDO COM UMA VELOCIDADE ESPANTOSA PRINCIPALMENTE PARA NÓS, MEMBROS DA
PRIMEIRA CASA DA AMIZADE CANADENSE QUE, COMO MUITAS DE NOSSAS CASAS, ERA UMA
CONSTRUÇÃO DE ESTRUTURA FRÁGIL, ABERTA A TODOS OS CAPRICHOS DO TEMPO. TINHA UM
GRANDE AQUECEDOR TIPO QUEBEC BEM NO MEIO DE NOSSA BIBLIOTECA E DA SALA
PRINCIPAL DE TRABALHO.
AQUELE
AQUECEDOR COMIA CARVÃO COMO UM HOMEM FAMINTO COME PÃO. ESPALHAVA UM INTENSO
CALOR EM UM RAIO DE MAIS OU MENOS UM METRO A UM METRO E MEIO, DEIXANDO OS
CANTOS EXPOSTOS AO VENTO MAIS FRIO DO QUE NUNCA. HAVIA TAMBÉM UM GRANDE FOGÃO,
QUE EXIGIA MAIS CARVÃO. ERA USADO PARA COZINHAR AS REFEIÇÕES TRÊS VEZES AO DIA
E ESPALHAVA POUCO CALOR. OS VISITANTES ERAM MUITOS DURANTE AQUELE INVERNO
SEVERO, NO INÍCIO DO TEMPO DA DEPRESSÃO. VINHAM ÁS CENTENAS, O QUE NÃO NOS
AJUDAVA EM NOSSO PROBLEMA DE AQUECIMENTO!
SIM,
ERA UM DAQUELES DIAS, E O AQUECEDOR CONSUMIA VORAZMENTE. O COZINHEIRO TINHA
ACABADO DE NOS INFORMAR QUE TINHA CARVÃO SOMENTE PARA MAIS DUAS REFEIÇÕES.
DUVIDAVA MUITO QUE HAVERIA CARVÃO SUFICIENTE PARA O GOGÃO E O AQUECEDOR.
MOSTROU-NOS SUA ÚLTIMA PORÇÃO DE CARVÃO, QUE TINHA JUNTADO CUIDADOSAMENTE DO
DEPÓSITO E QUE SERIA TUDO- E QUERIA SABER O QUE EU PROPUNHA FAZER EM RELAÇÃO A
ISTO!
UNS
70 PARES DE OUVIDOS OUVIRAM ESTA PERGUNTA COM UM INTERESSE PESSOAL. ERAM OS
VISITANTES, OS QUAIS CHAMAMOS DE IRMÃOS CRISTOVÃO. OUTRAS PESSOAS OS CHAMAM DE
VADIOS E PEDINTES. CRIARAM UM HÁBITO DE PASSAR OS DIAS EXTREMAMENTE FRIOS NA
CASA DA AMIZADE LENDO, CONVERSANDO, FUMANDO OU SIMPLESMENTE SENTADOS QUIETOS E
SABOREANDO O AQUECIMENTO E A COMODIDADE DO LUGAR. NOSSA CASA ESTAVA SEMPRE
ABERTA PARA ELES E TINHAM SEMPRE A CERTEZA DE ENCONTRAR LÁ ALGUM VELHO AMIGO
DEIXADO EM CALGARY, HALIFAX OU EDMONTON, ESPERANDO PARA APROVEITAR A PRÓXIMA
CHANCE DE PEGAR CARONA NOS TRENS DE CARGA, SEM SER PEGO PELA POLÍCIA.
SIM,
A NOTICIA DE QUE NÃO TÍNHAMOS CARVÃO SE ESPALHOU RÁPIDO, ERA UM CASO DE
IMPORTÂNCIA VITAL PARA TODOS NÓS. – NENHUM CARVÃO, NENHUM AQUECIMENTO, NENHUMA
COMIDA. E O QUE IRIA FAZER A ESTE RESPEITO? NOSSA CONTA BANCÁRIA NÃO TINHA
FUNDO SUFICIENTE NEM PARA COMPRAR UMA PORÇÃO PEQUENA DE CARVÃO, QUANTO MAIS UMA
OU MESMO MEIA TONELADA, QUE O CASO DE EMERGÊNCIA EXIGIA.
A
ORAÇÃO ERA A ÚNICA RESPOSTA QUE CONHECIA, UMA ORAÇÃO DE FÉ E EM SUA DIVINA
PROVIDÊNCIA. ENTÃO, DEVAGAR, MAS COM CLAREZA, DISSE AO COZINHEIRO E AOS IRMÃOS
PRESENTES QUE TERÍAMOS QUE PEDIR A DEUS PELO CARVÃO, PEDIR SIMPLES,
HUMILDEMENTE, COM COMPLETA FÉ, ACRESCENTANDO UMA PEQUENA OBSERVAÇÃO QUE, POR
CAUSA DESTA EMERGÊNCIA E DA TEMPERATURA ABAIXANDO, PRECISÁVAMOS DO CARVÃO HOJE,
ANTES DAS 4 HORAS DA TARDE. A PORÇÃO DE CARVÃO NÃO DURARIA MAIS DO QUE ISTO.
ASSIM QUE COMECEI A FICAR DE JOELHOS PARA REZAR E O COZINHEIRO TAMBÉM,(UM NÃO
CATÓLICO), MAS JÁ TREINADO EM NOSSAS ORAÇÕES;- UM BARULHO DE CADEIRAS SENDO
ARRASTADAS ANUNCIAVA A TODOS OS IRMÃOS CRISTOVÃO, NÃO IMPORTANDO QUAL FOSSE SUA
FÉ, ESTAVAM PRONTOS PARA PARTICIPAR CONOSCO.
DE
REPENTE, UMA VOZ PROFUNDA E ZOMBETEIRA SE FEZ OUVIR, DESAFIANDO MINHA COLOCAÇÃO
SOBRE PEDIR A DEUS. DIZIA PARA TODOS
PARAREM COM ESTA TOLICE DE ORAÇÃO. TODOS EM MENTE SÃ SABIAM QUE A RELIGIÃO ERA
O ÓPIO DO POVO E NADA MAIS. PERCEBI UMA VEZ MAIS QUE TÍNHAMOS UM IRMÃO
COMUNISTA EM NOSSO MEIO.
SEM
PRESTAR ATENÇAO EM SUA CONTÍNUA INVESTIDA, AJOELHEI-ME E EM VOZ ALTA REZEI UM
PAI-NOSSO, UMA AVE-MARIA E UM GLÓRIA;- ENTÃO LISTEI NOSSAS NECESSIDADES AO
ESPÍRITO SANTO, O PAI DO POBRE. ACRESCENTEI UM CURTO LEMBRETE A MARIA, SUA
ESPOSA, SOBRE A HORA FATAL – 4 HORAS! DEPOIS SENTEI-ME EM MINHA ESCRIVANINHAE
CONTINUEI COM MINHAS CARTAS. O COZINHEIRO VOLTOU PARA A COZINHA. E TODOS OS QUE
TINHAM REZADO COMIGO, RETORNARAM PARA SUAS CARTAS E CONVERSAS.
NOSSO
AMIGO COMUNISTA NÃO DEIXARIA QUE ISTO FICASSE ASSIM. TUDO BEM, DISSE EM VOZ
ALTA, TODOS REZARAM PARA UM DEUS QUE NÃO EXISTE. ENTÃO ELE FICARIA ATÉ AS 4
HORAS PARA TESTEMUNHAR NOSSA COMPLETA DERROTA E DIVERTIR-SE QUANDO AQUELA PRAGA
DE CARVÃO NÃO CHEGASSE. TAMBÉM FICARIA DE OLHO EM MIM, PARA VER SE EU NÃO
TELEFONARIA PARA ALGUM BENFEITOR PARA PEDIR COMBUSTÍVEL.
E
CONTINUOU. ERA HORA DE CURAR O POVO DE TODA A TOLICE. EU JÁ ESTAVA PERDIDA,
NATURALMENTE. MAS ELE ODIAVA VER ESTES HOMENS BONS (TODOS MEMBROS DO
PROLETARIADO OPRIMIDO), SEREM TÃO CEGOS E ENGANADOS PELA MINHA TOLA FÉ EM ALGO
QUE NUNCA EXISTIU E JAMAIS EXISTIRIA.
OUVI EM SILÊNCIO TUDO O QUE
TINHA A DIZER E ENTÃO PERGUNTEI A ELE O QUE SENTIRIA E O QUE FARIA SE O CARVÃO
CHAGASSE A TEMPO! (ISTO ERA COMPLETAMENTE POSSÍVEL DE ACONTECER NA CASA DA
AMIZADE ONDE UMA CENTENA DE EMERGÊNCIAS, INCLUINDO AS TRÊS REFEIÇÕES DIÁRIAS,
ERAM MILAGROSAMENTE PROVIDENCIADAS TODOS OS DIAS).
PENSOU
NA MINHA PERGUNTA POR UM INSTANTE E DISSE QUE, SE ISTO ACONTECESSE, ELE
EXAMINARIA O ASSUNTO RELIGIÃO E DEUS, COM A MENTE MAIS ABERTA POSSÍVEL. A
SITUAÇÃO, DESTA FORMA, EQUIVALIA A UMA PROMESSA PÚBLICA. PELO PERÍODO DE UM OU
DOIS MINUTOS REINOU UM SILÊNCIO MORTAL O
TIC-TAC DE NOSSO VELHO RELÓGIO DE PAREDE PODERIA SER OUVIDO COMO UM SINO. ASSIM
TODOS MAIS UMA VEZ, VOLTARAM PARA O QUE ESTAVAM FAZENDO – TODOS MENOS EU. FIZ
UM PRETESTO DE ESTAR ESCREVENDO. MAS TUDO O QUE EU PODIA OUVIR NAQUELE ZUMBIDO
DE CONVERSA ERA O TIC-TAC DO RELÓGIO. TERIA SIDO PRESUNÇOSA DEMAIS? TERIA
ULTRAPASSADO OS LIMITES EM MOSTRAR MINHA CERTEZA INTERIOR DE QUE DEUS E NOSSA
SENHORA OUVIRIAM NOSSA SIMPLES ORAÇÃO E A ATENDERIAM ANTES DAS 4 HORAS? PODERIA
FAZER ISTO – MARCAR HORA PARA A PROVIDÊNCIA DE DEUS?
ESTES
PENSAMENTOS DANÇAVAM UM FANDANGO DENTRO DE MINHA CABEÇA. COM TODO CORAÇÃO
DESEJAVA IR A IGREJA NA ESQUINA E CONVERSAR COM DEUS SOBRE ESTA SITUAÇÃO
INESPERADA. MAS ISTO EU NÃO FARIA. NÃO. NOSSO AMIGO COMUNISTA SUSPEITARIA QUE
EU FOSSE PEDIR OU COMPRAR O CARVÃO. NÃO. TINHA QUE FICAR SENTADA, ERETA. TINHA
QUE PARECER DESPREOCUPADA.
DEVAGAR,
NO INÍCIO, DEPOIS MAIS DEPRESSA, MAIS DEPRESSA, COMECEI A FAZER ATOS DE FÉ.
IMPLOREI A MARIA PELO CARVÃO, NÃO SÓ POR CAUSA DE NOSSA NECESSIDADE DE CALOR E
COMIDA, MAS TAMBÉM PORQUE A ALMA DE UM HOMEM ESTAVA ENVOLVIDA. E DURANTE TODA
MINHA ORAÇÃO SILENCIOSA O VELHO RELÓGIO MARCHAVA, BATENDO SEUS AMÉNS.
O
ALMOÇO TROUXE UMA DIVERSÃO BEM-VINDA. ATÉ MESMO LAVAR OS PRATOS AJUDOU. ERAM 2
HORAS. VOLTEI PARA A MINHA ESCRIVANINHA -
EM SILÊNCIO, COM UM POUCO DE MEDO, PORÉM, ACREDITANDO.
TRÊS
HORAS. TRÊS E VINTE. OS ÚLTIMOS VESTÍGIOS DE CARVÃO FORAM PARA O AQUECEDOR. O
FOGÃO JÁ ESTAVA FRIO. DA COZINHA UMA DESAGRADÁVEL CORRENTE DE AR FRIO COMEÇAVA
A SER SENTIDA. O COZINHEIRO VEIO PARA A BIBLIOTECA, CUIDADOSAMENTE FECHANDO A
PORTA DA COZINHA. SEU JANTAR ESTAVA TODO PREPARADO, MAS NÃO TINHA FOGO PARA
COZINHÁ-LO.
TRÊS E TRINTA E SETE. QUINZE
PARA AS QUATRO. DEZ. O COMUNISTA RIA E COMEÇOU A DISCURSAR PARA A MULTIDÃO DE
HOMENS CALADOS E MOROSOS. MEU CORAÇÃO ESTAVA PESADO E MINHA ALMA EM ESCURIDÃO
POR ALGUNS MOMENTOS. NATURALMENTE TINHA SIDO PRESUNÇOSA.
CINCO
PARA AS QUATRO, TRÊS. A VOZ DO ORADOR TORNOU-SE UM SOFRIMENTO PARA MEUS OUVIDOS
E MINHAS LÁGRIMAS ESTAVAM PRESTES A CAIR.
UM
MINUTO PARA AS QUATRO – E A PORTA DA FRENTE ABRIU-SE COM UM PONTAPÉ! UM HOMEM
DE ROSTO SUJO COM UM PAPEL SUJO EM SUAS MÃOS SACUDIU A NEVE DOS PÉS E
VIGOROSAMENTE PERGUNTOU SE ALI ERA A CASA DA AMIZADE. TINHA, DISSE ELE, ORDENS
PARA ENTREGAR UMA TONELADA DE CARVÃO! ALGUÉM FICASSE ESPERTO E O AJUDASSE A
COLOCÁ-LO NO LUGAR, POIS ELE NÃO TINHA O DIA INTEIRO PARA FAZÊ-LO.
O
VELHO RELÓGIO BATEU QUATRO VEZES. NUNCA ESTA VELHA VOZ SECA E ROUCA TINHA FEITO
TANTA MÚSICA EM MEUS OUVIDOS. NENHUM OUTRO SOM FORA OUVIDO. NINGUÉM SE MOVEU. O
HOMEM DO CARVÃO FICOU PARADO E OLHANDO, ESPANTADO COM A QUALIDADE DO SILÊNCIO
QUE SAUDOU SUA REQUISIÇÃO APAIXONADA. TENHO CERTEZA DE QUE PARECÍAMOS SURDOS E
MUDOS PARA ELE.
DE
REPENTE, COMO QUE UM TOQUE DE CLARIM, TODOS SE MOVIAM, FALANDO ALTO, INDO E
VINDO PARA AJUDAR A CARREGAR A TONELADA DE CARVÃO PARA O DEPÓSITO QUE TÍNHAMOS
CONSTRUÍDO NOS FUNDOS.
QUANDO
O CARVÃO ESTAVA LÁ DENTRO E ESTÁVAMOS A SÓS, O AGORA SILENCIOSO COMUNISTA E EU
SENTAMOS E NOS OLHAMOS. DEVAGAR, ELE SE LEVANTOU, OLHOU NO CRUCIFIXO DIANTE DO
QUAL SEMPRE TEMOS UMA VELA ACESA E DISSE, DISTINTA E CLARAMENTE;- NAZARENO, VOCÊ VENCEU DE NOVO.
RECENTEMENTE
RECEBI UM CONVITE PARA UMA ORDENAÇÃO. NÃO PODERIA IR PORQUE ERA MUITO LONGE. DE
QUALQUER FORMA, SERIA MUITO CARO IR ATÉ LÁ. MAS FUI EM ESPÍRITO. A OCASIÃO ERA
A ORDENAÇÃO DO HOMEM QUE NÃO ACREDITOU QUE DEUS PODERIA MANDAR CARVÃO PARA SUAS
CRIANÇAS FRIORENTAS E CANSADAS DA PERIFERIA DE TORONTO. ALELUIA!!!!!!!!
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