A peregrina era uma senhora idosa.
Sendo outono, ela estava vestida com uma grossa saia preta feita a mão e uma
blusa de lã. Nos pés tinha sapatos de couro feitos em casa e em seu ombro
trazia um xale. Também usava um parka russo (um tipo de casaco), com lã de
carneiro por dentro e coberto por fora com um material de lã pesado e escuro.
Em seu peito usava um ícone pequeno, que era o sinal do peregrino. Tinha seus
sessenta anos. vinha de um santuário de Nossa Senhora e estava a caminho de sua
casa, a uns 110 km. Da nossa.
A sala em que estávamos sentados era
iluminada com luzes de querosene. Um clarão de fogo estalava na lareira. Nossa
família e os empregados estavam todos sentados em volta da peregrina, ouvindo
seu conto. Eu absorvia toda palavra com um coração que martelava em minhas
costas. Ela nos contou sobre suas viagens e sobre a bela recepção que teve
naquele lugar sagrado, a alegria que sua alma experimentou, a paz que teve. Daí
continuou a contar que na volta tinha que passar por uma grande floresta. E foi
isso o que nos contou.
As florestas são lugares lindos,
pois muitos santos nos tempos de outrora se escondiam nelas para evitar
perseguições. Como vocês todos sabem, quando sua alma está em paz e o silencio
de Deus reina em seu coração, todo o seu ser muda sob seu santo toque. Seus
ouvidos podem ouvir as árvores louvando a Deus e as flores e grama
bendizendo-o. e se você chorou por seus pecados e os de seus irmãos e se rezou
para que o mundo todo venha a conhecer a
Deus e amá-lo, então Deus lhe concede a graça de ouvir coisas selvagens falarem
sobre Ele- uma com as outras. Assim, as florestas são realmente lugares
abençoados.
Mas, como todos os cristãos sabem,
as florestas também são lugares perigosos. Pois o príncipe do mal e seus anjos
também gostam das florestas. Um cristão seria um tolo se não se benzesse 3
vezes antes de entrar numa floresta. E é bom também segurar um ícone quando
atravessar uma floresta no crepúsculo ou durante a noite, invocando os nomes de
Jesus e sua mãe Maria.
Assim fiz antes de entrar na
floresta da qual estou falando. Não tinha medo. A paz de Deus e seu silencio
estavam comigo, pois havia chorado nos lugares sagrados pelos meus pecados e os
pecados do mundo. Mas, mesmo assim, fiquei um pouco desconfortável quando
caminhava nas profundezas da floresta. Senti com todo o meu ser que naquele
momento o Senhor estava permitindo as forças do mal habitarem naquela floresta.
Então, repetia os nomes de Jesus e Maria constantemente.
Mas os caminhos de Deus não são os
dos homens, como todos sabem do livro de Jó. Deus permitiu que ele fosse
tentado. O mesmo aconteceu comigo. Pois, antes que soubesse, ouvi as árvores
cochicharem entre si. Embora a noite estivesse calma, havia algo como um vento
no meio delas. Estavam cochichando com medo e tremiam com a chegada do mal.
Percebi que as criaturas selvagens da floresta começaram a fugir e se esconder.
Comecei a me benzer, pois o sinal da cruz é poderoso contra o mal.
A estrada se curvava um pouco. Logo
após a curva estava diante de mim um homem! Não gostei de seus olhares. Mas o
que poderia ele querer de mim uma peregrina? Dinheiro? Não tinha. Nunca levamos
dinheiro em peregrinações. Comida? Já havia comido meu pão e o sal e havia
muito pouca água em minha garrafa. Assim, não poderia me roubar. Nem o fez. Ele
estava indo no mesmo caminho que eu, assim me disse, por isso me acompanhava.
Ele não me saudou com o nome de Jesus, mas simplesmente me chamou de vovó.
Ele me perguntou de onde vinha.
Contei-lhe sobre o santuário que tinha visitado. Ele começou a rir e falar com
estranha sabedoria que a religião era uma superstição a nós pregada pelos
padres para nos conservar pobres e submissos aos ricos. Assim continuou, usando
grandes palavras que eu entendia pela metade. Mas o que disse começou a me soar
muito bem;- era verdade que nosso povo era pobre e explorado em muitos lugares.
Sem perceber – vocês acreditam? Eu o estava ouvindo atentamente. De repente, me
pareceu que ele estava dizendo a verdade.
Então ele começou a falar sobre
Nossa Senhora. Ele zombou dela. Mas daí, talvez ele não estivesse zombando
tanto dela quanto de nós, que acreditamos que ela deu a luz ao Senhor e
permaneceu virgem. Ele disse que isto era idolatria. Só então percebi o que ele
estava dizendo! Como sabem, todo peregrino carrega água benta consigo. Não
saímos sem ela. Em silêncio, peguei minha garrafa. Estava ficando escuro, assim
ele não podia ver o que eu estava fazendo. Joguei água benta nele com o nome de
Jesus e da Santa Trindade.
Agora, vocês podem não acreditar,
mas isto é tão verdadeiro quanto o Evangelho;- ele gritou. Contorceu-se e caiu
no chão – e desapareceu, como se nunca tivesse estado ali. Mas antes de
desaparecer, gritou;- toda a Rússia será coberta com sangue por causa das
coisas que eu disse. Milhões pensarão como eu. Haverá choros, gemidos e
lágrimas por toda esta terra.
Vim para vencer e vencerei. E nem o
se Deus nem sua Santa Mãe serão capazes de evitá-lo. Suas palavras foram tão
terríveis que não tenho vergonha em dizer que caí no chão, desmaiada. Quando
acordei, tudo estava escuro e eu estava morrendo de medo. Levantei-me e comecei
a andar vagarosamente.
De repente, havia uma grande luz no
caminho e uma jovem, vestida como eu em vestes de peregrinação, com um ícone em
seu peito, veio até mim e disse;- NÃO TENHA MEDO. É verdade o que o homem
disse, mas ele não era um homem.
Estas coisas acontecerão para que a
Santa Rússia possa ficar na cruz com meu FILHO para redimir o mundo. A única
maneira de o mundo ser redimido é através do sofrimento com meu FILHO. NÃO
TENHA MEDO.
Chegará um dia em que, sob o sinal
de meu FILHO, guiarei a Rússia para mostrar a face de meu FILHO para o mundo.
Depois ELA também desapareceu e eu
vi as luzes do vilarejo. Esta história nos foi contada por uma peregrina;- ouvi
quando tinha 9 anos de idade. Podem ou não acreditar, naturalmente, mas foi
deste modo que nos foi contada, em nossa casa, diante da lareira, há tantos
anos atrás.
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