Dispor a alma para receber o dom
divino da graça;- os odres novos.
A contrição restaura-nos e
prepara-nos para receber novas graças.
A confissão sacramental, meio para
crescer na vida interior.
Jesus
ensinava, e os que o escutavam entendiam-no bem. Todos os que ouviram pela
primeira vez as suas palavras narradas no Evangelho, conheciam os remendos nas
roupas e todos também, acostumados aos trabalhos do campo, sabiam o que
acontece quando se lança o vinho novo, extraído da vinha recém vindimada, em
odres velhos. Com essas imagens simples e bem conhecidas, o Senhor ensinava as
verdades mais profundas sobre o Reino que Ele viera trazer ás almas;- ninguém
coloca remendo novo em pano velho;- do contrário, o remendo levará consigo
parte do tecido, e o rasgão tornar-se-á maior. Também não se lança vinho novo
em odres velhos;- do contrário, os odres arrebentam e todo o vinho se derrama;-
o vinho novo lança-se em odres novos e assim as duas coisas se conservam.
Jesus declara a necessidade de
acolher a sua doutrina com um espírito novo, jovem, com desejos de renovação;-
pois da mesma maneira que a força da fermentação do vinho novo faz estalar os
recipientes já envelhecidos, assim também a mensagem que Cristo trouxe á terra
tem que quebrar o conformismo, a rotina e as estruturas arcaicas. Os apóstolos
lembrar-se-iam daqueles dias junto de Jesus como o início da sua nova vida;-
não tinham recebido a pregação do Senhor como mais uma interpretação da lei,
mas como uma vida nova que neles surgia com um ímpeto extraordinário e que lhes
reclamava disposições novas. Sempre que os homens se encontraram com Jesus ao
longo destes vinte séculos, alguma coisa de novo surgiu neles, rompendo
atitudes velhas e gastas. Já o profeta Ezequiel havia anunciado que Deus concederia
outro coração e um espírito novo aos que o seguissem. São Beda, ao comentar
esta passagem do evangelho, explica como os apóstolos se transformaram no dia
de Pentecostes, ao mesmo tempo que se enchiam do fervor do Espírito Santo. O
mesmo aconteceria depois na igreja com cada um dos seus membros, uma vez
recebidos o batismo e a confirmação. Estes odres novos – a alma limpa e purificada
– devem estar sempre cheios;- pois, quando vazios, a traça e a ferrugem os
consomem;- mas a graça conserva-os cheios.
O vinho novo da graça necessita de
umas disposições na alma constantemente renovadas, em torno do empenho por
começar e recomeçar no caminho da santidade, que é um sinal de juventude
interior, dessa juventude própria dos santos, das pessoas enamoradas de Deus. É
um empenho que se traduz na disposição habitual de corresponder ás moções e
insinuações do Espírito Santo, pois desse modo nos preparamos para receber
outras novas. Como também na disposição de recorrer ao Senhor, pedindo-lhe que
cure a nossa alma, sempre que não tenhamos sido plenamente fiéis. Limpa, Senhor
Jesus – pedimos-lhe com Santo Ambrósio, a podridão dos meus pecados. Enquanto
me tens atado pelos laços do amor, cura o que está doente. Eu encontrei um
médico que vive no céu e derrama o seu remédio sobre a terra. Só Ele pode curar
as minhas feridas, pois não tem nenhuma;- só Ele pode tirar do meu coração a
sua dor e da alma a sua palidez, pois Ele conhece os segredos escondidos. Só o
teu amor, Senhor, pode preparar a minha alma para receber mais amor.
O
vinho novo, que o Espírito Santo traz constantemente á alma, não envelhece, mas
os odres podem envelhecer. Quando se quebram, são atirados ao lixo e o vinho
perde-se. Por isso é necessário restaurar continuamente a alma, rejuvenescê-la,
pois são muitas as faltas de amor, os pecados veniais talvez, que a impedem de
receber mais graças e a envelhecem. Nesta vida, sempre sentiremos as feridas
dos pecados;- defeitos do caráter que não se vencem de maneira definitiva, chamadas
da graça que não sabemos atender com generosidade, impaciências, rotina na vida
de piedade, faltas de compreensão...
O que nos prepara para novas graças
é a contrição, que aumenta a esperança, evita a rotina e faz com que o cristão
se esqueça de si mesmo e se aproxime de Deus com um ato de amor mais profundo.
A contrição caracteriza-se pela aversão ao pecado e pela conversão a Cristo.
Não se identifica, portanto, com o estado em que uma alma pode encontrar-se por
causa dos efeitos desagradáveis do seu erro (a quebra da paz familiar, a perda
de uma amizade...), nem mesmo consiste no desejo de não se ter feito o que se
fez...;- é a condenação decidida de uma ação, a conversão para o bom, para a
santidade de Deus manifestada em Cristo;- é a irrupção de uma vida nova na
alma, cheia de amor ao encontrar-se novamente com o Senhor. Por isso, não sabe
arrepender-se, não se sente movido á contrição quem não relaciona os seus
pecados, tanto os grandes como as pequenas faltas, com o Senhor.
Diante de Jesus, todas as ações
adquirem a sua verdadeira dimensão. Se ficássemos a sós com as nossas culpas,
sem essa referencia á pessoa ofendida, provavelmente justificaríamos e
tiraríamos importância ás nossas faltas e pecados, ou então nos encheríamos de
desalento e desesperança diante de tanto erro ou omissão. O Senhor ensina-nos a
conhecer a verdade sobre a nossa vida e, apesar de tantos de feitos e misérias,
cumula-nos de paz e de desejos de ser melhores, de recomeçar novamente. A alma
humilde sente a necessidade de pedir perdão a Deus muitas vezes ao dia. Cada
vez que se afasta do que o Senhor esperava dela, compreende a necessidade de regressar
como o filho pródigo, com verdadeira dor;- Pai, pequei contra o céu e contra
ti;- já não sou digno de ser chamado teu filho;- trata-me como a um dos teus
jornaleiros. E o Senhor, que está perto dos que têm um coração contrito,
escutará a nossa oração. Com esta contrição, a alma prepara-se continuamente
para receber o vinho novo da graça.
O Senhor sabendo que somos frágeis,
deixou-nos o sacramento da penitência, em que a alma não só sai restabelecida –
mas também surge com uma nova vida, se porventura tinha perdido a graça.
Devemos recorrer a este sacramento com uma sinceridade plena, humilde,
contrita, com desejos de reparar. Uma confissão bem feita implica um exame
profundo;- se for possível diante do sacrário – e sempre na presença de Deus. é
nesse exame de consciência que o cristão vê o que Deus esperava da sua vida e o
que realmente ela foi;- a bondade ou malícia das suas ações, as omissões, as
ocasiões perdidas, a intensidade das faltas cometidas, o tempo em que
permaneceu nelas antes de pedir perdão. Quem deseje ter uma consciência
delicada procurará antes de mais nada confessar-se com frequência, e depois não
se contentará com uma confissão simplesmente válida, mas aspirará a fazer uma
confissão boa, que ajude eficazmente a alma elevar-se até Deus.
Para que a confissão frequente
consiga esse fim, é necessário seguir com toda a seriedade este principio;- sem
arrependimento, não há perdão dos pecados. Daqui nasce esta norma fundamental
para quem se confessa com frequência;- não posso confessar nenhum pecado venial
de que não se esteja séria e sinceramente arrependido. Há um arrependimento
geral. É a dor e a detestação dos
pecados cometidos em toda a vida passada. Esse arrependimento geral é de uma
importância excepcional para a confissão frequente, pois ajuda-nos a cicatrizar
as feridas deixadas pelas fraquezas, purifica-nos a alma e faz-nos crescer no
amor do Senhor. A sinceridade há de levar-nos, sempre que seja necessário,
descer a esses pequenos detalhes que dão a conhecer melhor a nossa fraqueza;-
como ? quando? Porque motivo? Por quanto tempo? Evitando tanto o detalhe
insubstancial e prolixo como a generalização.
É preciso dizer com simplicidade e
delicadeza o que aconteceu, dar a conhecer o verdadeiro estado da alma, fugindo
das divagações do tipo não fui humilde, fui preguiçoso, faltei á caridade, -
coisas que, por outro lado, são quase sempre aplicáveis a qualquer mortal. Numa
palavra, devemos cuidar de que nossa confissão frequente seja um ato pessoal,
em que pedimos perdão ao Senhor das nossas fraquezas concretas e reais, não de
generalizadas difusas.
Este sacramento da misericórdia é
refugio seguro;- aqui se curam feridas, se revitaliza o que estava gasto e
envelhecido, e se remedeiam todos os extravios, grandes ou pequenos. Porque a
confissão não é somente um juízo em que as ofensas são perdoadas, mas também um
remédio para a alma. A confissão impessoal esconde, com frequência, um ponto de
soberba e de amor próprio que trata de mascarar ou justificar aquilo que
humilha e deixa humanamente em má situação.
Para tornarmos mais pessoal este ato de
penitencia, devemos cuidar até do modo de nos confessarmos;- acuso-me de....
pois este sacramento não é um relato de umas coisas acontecidas, mas uma auto
afirmação humilde e simples dos nossos erros e fraquezas diante do próprio
Deus, que nos perdoará através do sacerdote e nos inundará com a sua graça.
Deus seja louvado! Dizias de ti para ti depois de terminares a tua confissão
sacramental. E pensavas;- é como se tivesse voltado a nascer.
Depois, prosseguiste com
serenidade;- Senhor – que queres que eu faça? E tu mesmo te deste a resposta;-
com a tua graça, por cima de tudo e de todos, cumprirei a tua Santíssima
Vontade – eu te servirei sem condições.
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