Aquele que primeira e
insuperavelmente explorou o significado de fé do evento pascal de Cristo foi o
apóstolo Paulo. A carta aos Romanos representa, deste ponto de vista, o ápice
da sua reflexão. Depois de ter apresentado, nos dois capítulos anteriores da
carta, a humanidade no seu estado universal de pecado e de perdição (Judeus e
gregos estão sob domínio do pecado)...;- pois não há diferença. Todos pecaram e
estão privados da glória de Deus, o apóstolo tem a incrível coragem de
proclamar que esta situação está agora radicalmente mudada, para sempre e para
todos, em virtude da redenção no Cristo Jesus.
Agora, no entanto, assim se inicia a
seção que descreve a nova situação. Inicia-se uma era nova na história dos
relacionamentos entre Deus e a humanidade. Uma mudança realmente histórica. Na
salvação realizada por Cristo, Paulo evidencia dois elementos distintos, embora
inseparáveis como as duas faces de uma mesma medalha;- um componente negativo,
que consiste na remoção do pecado ou justificação do ímpio, e um componente
positivo, que consiste no dom do Espírito e da vida nova.
Esta é uma constante que se observa
toda vez que se descreve sinteticamente a salvação, tanto no Antigo como no
Novo Testamento;- eu vos purificarei de todas as impurezas e de todos os
ídolos;- removerei do vosso corpo o coração de pedra ( elemento negativo). Eu
vos darei um coração novo e porei em vós um espírito novo (elemento positivo).
Fala-se de um remover e de colocar.
Ao apresentar Jesus ao mundo, João
Batista diz;- eis o cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo
(elemento negativo), mas acrescenta logo;- eis aquele que batiza no Espírito
Santo. Pedro faz a mesma coisa no dia de Pentecostes;- convertei-vos, e cada um
de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para o perdão de vossos pecados.
E recebereis o dom do Espírito Santo.
As polêmicas teológicas fizeram com que,
nesses dois elementos, ao comentar a carta aos Romanos, no passado se houvesse
colocado em relevo quase exclusivamente o elemento negativo da remoção do
pecado. Mas, na realidade, dos dois aspectos da salvação – a justificação do
ímpio e o dom do Espírito – é o segundo, para Paulo, o mais relevante. Disto
fala em todas as suas cartas, enquanto da justificação pela fé fala somente nas
cartas em que deve defender a própria missão aos gentios. É interessante que
quem diz isso é um dos mais qualificados exegetas protestantes do momento.
Quanto, depois de haver tratado da libertação do pecado e da lei, no começo do oitavo
capítulo da carta aos romanos, Paulo chega a falar do dom do Espírito, dá a
impressão de alguém que finalmente chegou aonde queria e pode abandonar-se livremente
em um hino. Pensamos nas palavras com as quais Beethoven introduz a segunda
parte da Nova Sinfonia, a parte coral com o hino á alegria;- ó amigos, chega
dessas notas. Entoemos um canto mais alegre e mais cheio de contentamento.
Pode-se pensar na afirmação do apóstolo;
A lei do Espírito que dá a vida no
Cristo Jesus te libertou da lei do pecado e da morte. Vós não viveis segundo a
carne, mas segundo o Espírito. Se alguém não tem o Espírito de Cristo, não
pertence a Cristo. O próprio Espírito se une ao nosso espírito, atestando que
somos filhos de Deus. o Espírito vem em socorro de nossa fraqueza.
A justificação do ímpio e a remissão
dos pecados não é, para Paulo, senão a condição para receber o dom mais belo e
mais completo da Páscoa de Cristo, isto é, o seu Espírito. Muitos estão
convencidos de que o nascimento e o irresistível desenvolvimento pentecostal e
carismático no interior das várias Igrejas cristãs se explicam também como
reação a uma insistência muito unilateral sobre o problema da justificação pela
fé, que deixou na sombra a doutrina e a experiência do Espírito. Esta terceira
força, como é chamada, assumiu, em pouco mais de um século, proporções
imprevisíveis e constitui hoje, segundo as estatísticas, o componente em mais
rápido crescimento no interior do cristianismo.
Ela poderia ajudar a encontrar,
finalmente, a solução para os problemas que se arrastavam por séculos e sobre
os quais nem mesmo um documento conjunto
da Igreja católica e da Federação Luterana Mundial chegou a encontrar um
acordo total. Na teologia e espiritualidade do movimento pentecostal, a
justificação pela fé não é vista somente como uma atribuição externa de justiça
que deixa o crente como era antes (simul iustus ET peccator);- convenceu-se,
como do lado católico (mesmo que não se afirme explicitamente ), que o Espírito
Santo transforma realmente a pessoa, dando-lhe um coração novo e morando nela.
Quando Paulo fala do Espírito Santo
– mesmo os exegetas mais rigorosos estão de acordo sobre isto – fala dele como
de uma experiência que todos fazem na Igreja, não simplesmente como de uma
doutrina;- experiência de unção no anúncio, de filiação divina na oração, de
força carismática no exercício do próprio ministério, de conforto nas
perseguições. É nisso que se mede se o Espírito Santo encontrou o
seu verdadeiro lugar na vida da Igreja, além do lugar encontrado na sua
teologia.
Seria muito triste se tudo isto ficasse
confinado no interior
de um movimento eclesial e não contagiasse, por reflexo, na substância, se não
na forma, toda a Igreja, como uma benéfica (corrente de graça) que se espalha
nela. Não são somente alguns que têm necessidade de um novo Pentecostes na
Igreja, mas todos os batizados.
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